11/04/2014 - (Fonte: Saite da Prefeitura de Colatina www.colatina.es.gov)
Nascido em Barbados, Mário Dalla Bernardina Segundo, 84 anos, não dá bola para o tempo. Não perdeu a capacidade de sonhar e fazer planos para o futuro. Quem conversa com ele recebe uma lição de amor à vida, percebe uma alegria e uma imensa vontade de viver, independente do tempo. Mostra que não há limite de idade para realizar o que se tem vontade.
Mário tem orgulho em contar a trajetória de sua vida, do trabalho na roça com os pais a empresário como construtor civil e dono de cerâmica. E também de sua primeira e única tentativa de ser político, como candidato a vereador, e que não deu certo. “Eu queria trabalhar para minha cidade. Fazer alguma coisa para a cidade que eu amo”, justificou.
O pai e a mãe de Mário, os agricultores Adelina Denardi e Roque chegaram a Barbados em 1906, bairro situado a 12 quilômetros do centro de Colatina, para trabalhar nas terras de Pedro Filho como meeiros, e ali tiveram os 12 filhos.
Era o ano da chegada da Estrada de Ferro Diamantina em Colatina, que anos mais tarde passou a ser a Estrada de Ferro Vitória a Minas, da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD). Só em Colatina a Diamantina construiu três estações; uma delas em Barbados. Por isso ficou marcado na memória de Mário desde a sua infância, as lembranças dos trens passando na linha férrea.
Ele lembra quando a estrada de ferro vinha por Colatina Velha, passava pelo centro da cidade (Avenida Getúlio Vargas, subia para a Rua Bartovino Costa), descia para a ponte de ferro do Bairro Vila Nova, passava em frente do Colégio Marista, saía na Avenida Rio Doce e seguia rumo a Minas Gerais. “Era época da Maria Fumaça. As estações de Barbados, Baunilha e Centro de Colatina foram construídas no mesmo período”, explica Mário.
Depois de trabalhar na roça com os pais, e até ajudado os pais a construírem a casa da família em Barbados, em 1944, descobriu que gostava da construção civil, setor que passou a trabalhar como profissional por toda a vida, como construtor e depois atuando como empresário do ramo ceramista. Em meio a tudo isso, casou e formou uma família com Eliza Seidel, com quem tem oito filhos, 17 netos e seis bisnetos.
Construção civil
Mário se orgulha de ter sido um dos mais requisitados construtores civis de Colatina. “De 1948 até no final dos anos 60 trabalhei como construtor autônomo e fui quem mais construiu obras no município. Eu tinha a empresa Bernardina & Cia, e só dentro de Colatina eu fiz 29 obras, entre moradias, igreja, hotel e escolas. Desde 1956 eu tenho a carteira do Crea (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia)”.
Entre as obras colatinenses, as construções das casas de Antonio Pagani (Avenida Getúlio Vargas), igreja de Santa Fé (estrada para Marilândia), torre da Catedral do Sagrado Coração de Jesus, prédio da Padaria Bolão, Coletoria Estadual, prédios do Hotel Juparanã. “Também construí as casas de Humberto Gobbi, Belmiro Gobbi, Antonio Zago, Antonio Menegatti, Dr. Adoris, e ainda várias em Colatina Velha, São Vicente e São Silvano. A Escola Virgínia Calmon (Vila Lenira) foi outra obra. Além da ampliação da sede de antiga empresa Telest, e depois encerrei a carreira”.
Mário contou que fez um dos primeiros prédios do então INPS (Instituto Nacional de Previdência Social), hoje INSS (Instituto Nacional de Serviço Social); e um prédio da Secretaria de Educação do Estado em Colatina, entre outros serviços para órgãos públicos.
De 1962 a 1966 ele trabalhou como empreiteiro da Vale. “Foram 39 obras, entre reformas e construções de plataformas de estações de trem, casas geminadas e escolas. Em Colatina, foram as construções de partes das plataformas da primeira estação, em 1964 (Bairro Esplanada) e da segunda, em 1974 (a atual, na Rodovia Colatina/Itapina).
No Espírito Santo, ainda para ela, construiu as plataformas de Piraqueassú (Ibiraçu), de Baixo Guandu e da localidade de Caboclo Bernardo (João Neiva, que não existe mais) e uma escola em João Neiva. Já em Minas Gerais, foram as construções das plataformas das estações de Conselheiro Pena, Intendente Câmara e Coronel Fabriciano e uma escola em Aimorés.
Da época, Mário disse cheio de saudades: “Era fantástico. Tenho saudades. Mas na época da construção de parte da plataforma da segunda estação, era difícil para trabalhar por causa do barulho e do movimento constante dos trens e das pessoas. Só na plataforma, eu trabalhei com 22 funcionários”, revelou.
Ele contou que tinha 130 funcionários na empresa de construção civil, e revelou que tudo era mais difícil do que é hoje. “Para construir hoje tem muitas facilidades, diversos equipamentos diferentes para trabalhar. Naquela época era tudo feito na mão, não tinha maquita. Para colocar um ladrilho usávamos um taco para cortar, com um pedaço de pau e marreta, e hoje a maquita faz tudo”, explicou.
Em 1954, enquanto ainda era construtor, Mário abriu uma fábrica de ladrilhos perto de onde mora até hoje, no Bairro Sagrado Coração de Jesus. “Eu tinha cinco funcionários. Em 1966 acertei as contas com os empregados, e deixei a empresa com os funcionários mais antigos”.
Logo depois, o colatinense desistiu da construção civil e deu baixa na carteira, mas ressalta que tem muita saudade da época de construtor. “Sou economista, mas não diplomado. Parei em 1966. Não ganhei dinheiro; tinha muita inflação. Ganhei experiência. Na época já existia a tal da porcentagem, que ganhavam por fora, mas eu nunca fiz. Eu morreria de fome se fosse preciso, mas não fazia isso”.
Depois que fechou a fábrica de ladrilho, ele comprou uma cerâmica do tio Cláudio Dalla Bernardina, em Barbados, fundada em 1906 pelo avô dele, e que fabricava tijolos e telhas. Segundo Mário o casarão, que foi construído em 1928, existe até hoje no local.
“Eu saí da construção civil mais tranqüilo, o que foi a minha salvação. Recebi a herança do meu pai, comprei um caminhão, fiz um barracão da empresa e consegui pagar as dívidas. “Fui proprietário da Cerâmica Barbados até 1997 e depois fechei as portas, pois estava dando prejuízo. Registrei a matéria-prima para continuar a trabalhar, mas surgiram alguns problemas e tive que desistir. Só no Espírito Santo a crise da Era Collor fechou 64 fábricas de cerâmica. Eu não tinha dinheiro, e tinha concorrente que estava melhor”, destacou.
Cartas ao governador e quadros para Ponte FA
Na década de 90, Mário chegou a ser candidato a vereador pelo PDT (Partido Democrático Trabalhista), mas não ganhou. Na época já começava a mostrar sua preocupação com o tráfego pesado da ponte Florentino Avidos, que na sua avaliação apresentava problemas com balanço. Chegou a enviar duas cartas ao então governador Albuíno Azeredo, sugerindo modificações e obteve resposta de uma. As três ele guarda com carinho até hoje.
Na carta de 22 de junho de 1991, ele diz que apesar de derrotado nas eleições passadas (1988), não deixou de, através do então jornal Folha dos Municípios, sugerir o alargamento da ponte. Nela, ele pede a correção no piso da ponte, “com uma mão de obra de boa qualidade, para evitar o forte balanço”, afirma.
Em sua avaliação ele diz que seria necessário colocar entre as cabeças do vão um ‘T de 4’, para evitar novamente o rebaixo do asfalto, o que diminuiria o balanço em até 80%. “E esta ponte é o coração do Norte do Estado, pois ela suporta um peso diário de blocos de granito. E se este serviço for feito, pode estar certo que os motoristas ficarão muito agradecidos. Aqui fica o meu apelo, que não é só para mim, mas para todos os colatinenses”.
Explana ao governador, que mandou a carta para que ele fizesse com que o veículo passasse sem impacto, fazendo um ‘T’ de chapa galvanizada, para dar passagem de um vão para o outro e não dar impacto como o que estava ocorrendo. “Por muitas décadas as carretas pesadas fizeram muito mal para a ponte. Se tivessem feito isso antes, anos atrás, não seria preciso proibir a passagem como aconteceu hoje (a partir de 2001). Passavam carretas de 80 a 90 toneladas. Claro que o ‘T’ seria calculado por um engenheiro para suportar o peso de um veículo pesado, com todas as normas técnicas da engenharia”.
Em carta enviada um mês depois, Albuíno responde, por meio da secretário-chefe da Casa Civil, José Eugênio Vieira, que encaminhou sua carta à Secretaria de Estado dos Transportes e Obras Publicas. Em 14 de outubro de 1992, Mário enviou a segunda carta cobrando as correções do asfalto.
Nela, ele afirma que: “Ao passar percebi que não deve demorar, pois o balanço é um pouco forte quando passa nos buracos, e cada dia que passa aumenta o tremor, pois como você sabe tudo que torce ou vibra demais pode acontecer alguma coisa. Estou lembrando porque inclusive os trabalhos do alargamento já estão prontos. Um lembrete do amigo oculto, colega do PDT de Colatina”.
Não satisfeito, Mário resolveu passar suas sugestões para as telas, utilizando gravuras e colagens. Em dois dos três quadros que fez na década de 90, e que ainda guarda em sua casa, ele mostra o que, na sua opinião, deve ser feito na Ponte. No primeiro ele volta ao passado, mostrando a ponte sob uma perspectiva diagonal, de quem vai subir na ponte pelo lado sul, com uma Maria Fumaça sobre ela. Para quem não sabe, a ponte, foi construída em 1926 para servir de passagem de uma estrada de ferro que não deu certo.
No segundo quadro ele mostra caminhões de carga pesada e carretas, que poderiam causar acidentes pelo excesso de peso, e propõe a construção de quatro pistas. “Existe estacas com índices de fratura que requerem reforço, entretanto, nas outras estacas que se considera perfeitas daqui a 30 anos ou mais elas estarão danificadas”, frisou.
E conclui que “ao invés de fazer uma reforma ou reforço, deveria fazer uma infraestrutura para suportar toda a carga de casa pilar, assim não haveriam futuras preocupações, prevendo o futuro com segurança. E também no tráfego com quatro pistas, vai depender do engenheiro fazer uma avaliação e os cálculos devidos. Basta dizer que esta ponte é um patrimônio histórico”, explicou. No terceiro quadro ele propõe o alargamento da ponte para a construção de quatro pistas.
Preserva hábitos
Mário encerrou suas atividades também na cerâmica, mas não fica parado. A rotina não cabe em sua vida, pois sempre está fazendo alguma coisa. No ano passado, estava fazendo uma obra em sua casa, uma laje, que segundo ele, só pagou para a empresa aplicar o concreto. “O resto ficou por minha conta. Ainda tenho muita força”, garante.
O colatinense tem orgulho em dizer que tem uma saúde de ferro. “Não tenho pressão arterial. Todo ano participo de um torneio de futebol, no Industrial Futebol Clube, de Barbados, com uns três times. Todo ano eles me convidam. Desde os 14 anos eu jogo futebol de várzea em qualquer posição que precise. Do futebol eu lembro do Hugo, que para mim era o melhor goleiro que vi jogar no Brasil. Era de ume empreiteira da Vale e morava em Itapina. Eu fui reserva dele”, contou.
Todos os dias, ele tem o hábito de levantar cedo e “resolver algumas coisas pendentes”, como mesmo diz. Depois, Mário toma banho, almoça e vai para Barbados onde fica até 17 horas trabalhando na área da cerâmica. Fica zelando pelo barracão (que existe há 86 anos), “fazendo uma coisa e outra, limpando, retirando o mato. É uma área de 68 mil metros quadrados que eu cuido até hoje com muito carinho” frisou.
E reforça: “Eu vou todos os dias na cerâmica, de domingo a domingo. No sábado e no domingo eu vou para lá de manhã. Tem 46 anos que eu não faço mais consulta nenhuma. Estou fazendo algumas pesquisas. Tenho projetos de vida, muitos sonhos ainda”.
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